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O Pint of Science Brasil defende o manifesto “Investimento ou morte” pelo fim dos cortes e contingenciamento de recursos nas áreas de pesquisa e desenvolvimento em ciência, tecnologia e inovação. Durante o evento, serão divulgadas nas redes sociais as hashtags #InvestimentoOuMorte #CienciaBrasileira #EuDefendoACiencia. O texto é de autoria do Pint Brasil e terá a assinatura de algumas entidades ainda a confirmar. Confira o manifesto:

Investimento ou morte!

Neste 7 de setembro, o povo brasileiro se enche de orgulho e certo patriotismo para celebrar o Grito da Independência, momento simbólico quando, há quase dois séculos, D. Pedro I bradou “Independência ou morte”, às margens do Rio Ipiranga. Nos dias de hoje, a cena registrada em pinceladas ufanistas no quadro de Pedro Américo merece uma atualização mais realista e, de fato, patriótica. 

“Investimento ou morte!” é o grito de alerta da ciência brasileira para que os recursos financeiros cheguem aos laboratórios de pesquisa. Sem que a ciência seja encarada como um projeto de Estado, nunca deixaremos a pecha de país colonial. Sem que o País financie pesquisa e desenvolvimento, teremos pouco a celebrar nesta Semana da Pátria.

Foram investimentos em pesquisas que possibilitaram avanços imprescindíveis, desde o  combate a doenças tropicais até a exploração de petróleo em águas profundas. Será a valorização de nossas instituições científicas, como a Fiocruz, por exemplo, que dará protagonismo ao País na busca pela vacina da covid-19, para sairmos da maior crise mundial de saúde de nossa história.

Nos últimos anos, entretanto, os governos brasileiros têm agido na contramão do que praticam os países desenvolvidos. Segundo dados do Indicadores Nacionais de Ciência, Tecnologia e Inovação, de 2018, o Brasil investiu, em 2017, menos de 1,3% do PIB em pesquisa e desenvolvimento, enquanto as nações mais desenvolvidas destinam em média 3%, chegando a 4,5% do PIB, no caso da Coreia do Sul.

O Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), que teve um orçamento da ordem de R$ 8 bilhões em 2013, conta, hoje, com R$ 3,5 bilhões. No ano passado, 84 mil pesquisadores correram o risco de perder suas bolsas por falta de recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Foi necessária uma grande mobilização de entidades científicas e acadêmicas e da sociedade para pressionar o governo pela liberação do pagamento.

O Fundo Nacional de Desenvolvimento de Ciência e Tecnologia (FNDCT), que desde 1969 tem financiado o desenvolvimento científico e tecnológico do País, nos últimos tempos vê os recursos cada vez mais represados. Em 2020, o orçamento proposto pelo governo, e aprovado pelo Congresso Nacional, contingenciou em torno de 88% desse recurso. Dos R$ 4,7 bilhões arrecadados pelo fundo, apenas R$ 600 milhões foram investidos, de fato, em ciência, tecnologia e inovação.

Na área da educação, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), órgão vinculado ao Ministério da Educação e responsável pelas bolsas de pós-graduação, que viu os recursos crescerem até R$ 7,4 bilhões, em 2015, hoje tem valores de R$ 3,2 bilhões, o mesmo patamar de uma década atrás. Um levantamento recente do site G1 também aponta uma redução de 73%, nos últimos 10 anos, da verba repassada para universidades e institutos federais investirem em infraestrutura. A quantia de R$ 2,78 bilhões em 2010 caiu para R$ 790 milhões em 2019.

Cortes orçamentários paralisam centenas de pesquisas nacionais em andamento, desperdiçando tempo e recursos já investidos em insumos e treinamento dos pesquisadores, desestimulando que os cientistas mantenham suas pesquisas no País e, finalmente, colocando em risco a sobrevivência da própria ciência brasileira. Em tempos de pandemia, a falta de investimento nos impede de desenvolver soluções dentro do País e nos condenam ao final da fila da imunização da covid-19, adiando a retomada da economia e agravando a crise social.

Por isso, nestes tempos bicudos, será a ciência brasileira que sustentará um genuíno projeto nacional. São ações como a retomada dos investimentos, a recuperação dos laboratórios de pesquisa, a reversão do processo de desindustrialização nacional, a mudança do perfil de nossa economia - com investimento em energia renovável e com o uso sustentável de nossa biodiversidade - que vão proporcionar o desenvolvimento nacional.

Não bastará o discurso patriótico sem a proteção de nossos recursos naturais, sem o fomento da pesquisa e sem a valorização profissional de nossos cientistas em instituições fortes e autônomas. Devemos buscar motivos reais para celebrar a Semana da Pátria, sem aceitar cenas idealizadas por pintores do passado, que não guardam conexão com a realidade. Só com a defesa concreta da ciência no presente poderemos nos orgulhar e legar ao futuro uma história que valha ser retratada.